segunda-feira, 30 de maio de 2011

FIFA: A grande dama

A quarta-feira da semana que vem será dia de eleição na FIFA. Uma mera formalidade. Joseph Blatter deverá ser reeleito, e mesmo ocupando o cargo há mais de uma década incluiu entre as suas promessas de campanha a intenção de "reconstruir a imagem da FIFA".

Também falou de reformas nos Comitês de ética, disciplinar e de apelação. Mas silenciou sobre o Comitê Executivo, principal orgão da entidade, cujos integrantes recentemente foram acusados de negociar votos para eleger futuras sedes de mundiais entre outras coisas.

Blatter chegou até mesmo a confessar já ter sido vítima de tentativa de suborno. Disse que quando era secretário-geral recebeu um envelope cheio de dinheiro e que não pôde recusá-lo por ter sido colocado no seu bolso. (Preparem-se porque o final da história é melhor)

Na impossibilidade da devolução, ao chegar à FIFA o entregou ao diretor financeiro que se encarregou de colocar o dinheiro na conta de um banco, de onde o mesmo seria sacado dias depois pelo próprio autor do suborno, que tinha sido avisado de que a quantia se encontrava lá, à sua disposição. Eu também gostaria de ter tido mais detalhes dessa história incrível mas Blatter é um homem atarefado, sem tempo para explicações menores.

Nestes dias que antecedem o pleito muita coisa tem sido dita. O fantasma da falência da ISL - o braço comercial da entidade, que durante vinte anos negociou os direitos de transmissão dos eventos organizados pela FIFA e naufragou em 2001 deixando uma dívida de 300 milhões de dólares - voltou a assombrar muita gente, inclusive, Ricardo Teixeira, presidente da CBF e do nosso Comitê Organizador da Copa de 2014.

O caso ISL, o segundo maior colapso financeiro da história da Suiça, terminou com a FIFA fazendo um acordo com a justiça. Vejam. Ninguém foi preso. Muita gente teria tido que devolver dinheiro. O problema é que o sigilo desse acordo vem sendo contestado na justiça por um jornalista.

Mas ainda que a vitória dele, tão improvável quanto a derrota de Blatter, revele todos os nomes e valores, qual seria o tamanho do dano que poderia causar à FIFA? Os cartolas do primeiro escalão são mestres em manter o jogo sob controle e estão cansados de dar provas disso.

O fato é que a FIFA, mais do que nunca, vai deixando de ser uma casa acima de qualquer suspeita. E não podemos esquecer, por um só momento que seja, de um detalhe: o nosso destino nunca esteve tão atrelado a ela.

A ruína da "grande dama" do futebol, financeira ou moral, também será nossa. É por essas e outras que a minha indignação vai ficando cada vez maior. Onde já se viu gastar bilhões do dinheiro público com estádios num país como o nosso?

Por mim podem jogar qualquer traço de ufanismo com relação a Copa de 2014 no lixo, ele não me serve. Para mim é tudo muito claro. Se um dia formos um país digno, reconhecido, de primeiro mundo - pra usar um clichê, uma vez que o primeiro mundo se encontra em plena convulsão - não terá sido por causa de uma Copa do Mundo, ou por causa de uma edição dos Jogos Olímpicos.

sexta-feira, 27 de maio de 2011

O futebol no cotidiano

Peço licença para dividir com vocês um fato corriqueiro. Algo cotidiano, mas que poderia muito bem servir de base para estudos comportamentais profundos. Deu-se com um zelador palmeirense na intenção, não de arrebanhar mais um torcedor para o time pelo qual ele torce, e sim com a sacana intenção de evitar que o seu maior rival, de repente, conquistasse mais um adorador. A tática para direcionar o interesse do gringo saiu quase por instinto.

Nas rápidas conversas travadas com o estrangeiro que fazia pouco havia se mudado para o Brasil o futebol tinha se tornado assunto cada vez mais frequente. E o tal homem, recentemente inserido nessa nossa sociedade, ao que tudo indica, não teve a menor dificuldade para sacar que estava ali a chave para se enturmar, para entrar de vez nos papos mais animados do botequim que ele costumava frequentar com moderação discutível. Mas deixemos de rodeio e vamos direto ao que interessa nessa conversa.

No dia da final do Campeonato Paulista, com a cidade tomada de vez pelo clima de decisão, o papo na passagem pela portaria se estendeu além do normal. O gringo se mostrou um tanto dividido. O zelador não pensou duas vezes:

_Corinthians nunca. Não faça isso É a pior coisa que existe! Se afaste, se afaste!

Mal intencionado, mas de alma bondosa, o rei da guarita não encontrou coragem para sugerir que ele não se deixasse levar pelo momento decisivo e passasse a prestar a atenção num tal time do Parque Antártica porque o filme da goleada para o Coritiba não lhe saia da cabeça e ele se convenceu de que isso não era coisa que se faça.

Com certo esforço, é verdade, argumentou a favor do Santos. Disse se tratar de um time simpático, que estava jogando bem e que, ao que tudo indicava, era sério candidato ao título paulista. Imaginou que a oferta de uma alegria fácil poderia cooptá-lo de vez. Se o gringo não viraria palmeirense pelo menos corintiano também não iria ser.

Quando sacou que a conversa ia mesmo além do esperado se surpreendeu com alguns comentários do finlandês, que semanas atrás tinha confessado pouco ter visto futebol na vida. Elogiar a habilidade de Neymar era chover no molhado, mas enaltecer o posicionamento e o poder de marcação do Jonathan parecia além da conta. O cara só podia estar tomando umas aulas de bola. Não era possível.

Aproveitou a deixa e puxou a conversa pro seu lado. Perguntou, cheio de esperança, se o estrangeiro já tinha visto o Valdívia jogar. Mas o gringo fez uma cara de quem não sabia do que se tratava. Fechou o semblante. O zelador o socorreu, tentou explicar. O gringo quase teve uma convulsão. Enrolou a língua pra tentar dizer o tal nome e tudo que conseguiu pronunciar foi algo parecido com:

_ Vôdivia!? ......

Desencantado o palmeirense despistou. Disse que se tratava de um bom jogador que, infelizmente, ainda não tinha encontrado seu melhor futebol. E secretamente se auto-sacaneou pensando que se ele ainda não tinha encontrado devia ser porque não sabia onde o tinha deixado.

O finlandês ouviu tudo com muita atenção. Não prometeu torcer para o Santos e nem deu alguma pista de que tinha entendido como devia ficar longe do Corinthians. Mas não partiu sem antes contar algumas aventuras vividas como volante de um time formado por alguns amigos da empresa marítima para a qual trabalha. Deixou no ar uma insinuação de que tinha deixado de ser um leigo no assunto. O zelador estava quase acreditando naquele semi-discurso quando veio a frase fatal:

_ Bom, Palmeiras, Corinthians. É tudo igual!

O zelador se despediu, com respeito. Mas em silêncio lamentou que o gringo não tivesse entendido absolutamente nada.

_ Palmeiras, Corinthians, tudo igual. Vê se pode? - disse indignado o zelador quando terminou de me contar a história.

sexta-feira, 6 de maio de 2011

A bola está com a Dilma

Em matéria de política as notícias não têm sido nada alvissareiras. Em caso de dúvida dê um passeio pelas páginas que tratam do assunto e tire as suas próprias conclusões. Tão desoladoras quanto elas têm sido os fatos envolvendo o futebol e a política. Na era Lula os nossos dirigentes nadaram de braçada e ganharam motivos de sobra para espantar os fantasmas outrora saídos de uma CPI que acabou esvaziada mas que serviu para expor os horrores escondidos no ventre do futebol nacional.

Entre as tantas ajudas dadas pelo ex-presidente aos cartolas está, inclusive, a assinatura de uma medida provisória autorizando o Corinthians a fazer parte da loteria batizada de Timemania mesmo depois do clube ter perdido o prazo de inscrição. Foi por isso que dias atrás o título de uma matéria que encontrei na internet me chamou a atenção.

O título dizia: "Estilo Dilma contrasta com "boleiragem" de Lula e já vira obstáculo para cartolas". O texto afirmava que os envolvidos com a Copa de 2014 eram os mais atingidos por essa mudança de estilo. Afirmava ainda que "o tom agora" era " mais de cobrança do que ajuda incondicional". É pouco eu sei. Mas talvez se trate da melhor notícia envolvendo futebol e política que eu li nos últimos tempos. Uma pena se tratar mais de uma versão do que, provavelmente, de um fato.

Eu estava no Palácio do Planalto em 2008 quando Lula recebeu os primeiros brasileiros campeões do mundo em um evento para celebrar os cinquenta anos do feito. Durante quase uma hora Lula costurou os principais momentos daquela conquista, com suas impressões pessoais e amarrou todas essas coisas com elogios individuais, sem deixar um deles sequer sem uma citação entusiasmada. Tudo com cara de improviso. Lance de mestre.

Na ocasião prometeu a todos uma aposentadoria que ainda não veio, e nem sei se deveria. O que eu sei é que promessa é promessa e não se deve fazer sem a certeza de poder cumprir. E isso nada tem a ver com religião, hein? Lula conquistou todos ali, estava claro no rosto de cada um, fossem eles jogadores ou não.

A oportunidade de acompanhar o ex-presidente de perto ao longo dos seus mandatos não tive, mas não creio cometer pecado se disser que naquele momento o seu discurso "boleiro" atingiu o auge. Em razão desse histórico de cumplicidade entre a nossa maior autoridade e os nossos dirigentes é que dar de cara com um título desses renovou em mim alguma esperança. Poder imaginar os nossos cartolas receosos de levar uma virada me alegra.

Dilma pode até não marcar o gol, mas o simples fato de deixar claro quem está com a bola já me faz levantar entusiasmado na arquibancada. E digo mais, não resta dúvida de que a trama que trouxe a Copa de 2014 para o Brasil é o resultado mais palpável dessa relação que se estabeleceu entre o poder executivo e os poderosos do mundo da bola. Eles têm muito em comum. Não deve ser por acaso que dos vinte e sete partidos em atividade no Brasil dez deles são presididos pelas mesmas pessoas há mais de uma década, alguns há mais de duas.

Só um louco para não levar em conta que na hora da festa todos os envolvidos farão questão de receber de volta as ajudas e os louros por ter jogado na defesa de tão custoso e problemático espetáculo. Dilma, ao tratar o assunto com o tom gerencial que ele exige, dá pistas de que poderá se revelar um tipo de jogadora que Lula não foi.

Melhor que isso só mesmo se fosse possível trocar as nossas eleições presidenciais de ano. Do contrário, teremos eternamente que lidar com essa realidade perversa que coloca no mesmo calendário a Copa e as eleições. Futebol e política quanto mais distantes melhor. Não para eles, claro, mas para nós.