sábado, 31 de maio de 2008

Inesquecível


















David Vincent
Associated press








Inesquecível


A foto dizia tudo. Guga faz um movimento. A raquete está na sua mão direita, e ela acima da sua própria cabeça. O braço esquerdo está esticado na altura do ombro, precisamente reto. A imagem sugere um balé, elegante. A bolinha amarela flutua no ar, à esquerda da cena. Guga está de costas. O que está de frente é a numerosa e enfeitiçada torcida da quadra central de Roland Garros. Uma multidão de olhares hipnotizados. Um flagrante fotográfico que me fez perceber, uma vez mais, a importância daquela figura que se despedia em alto estilo.
A história de Guga transcende porque extraiu do esporte algo mágico. Coisa cada vez mais rara. Sobre ele não basta dizer que foi o mais vitorioso tenista brasileiro.Guga foi além.
Há gente neste mundo que nem faz idéia do que é vencer uma Masters Cup derrotando nomes como André Agassi e Pete Sampras. O Sampras, cara! Eu nem os culpo por isso.
Mas há também aqueles que com compromisso, ou não, aprenderam a gostar de tênis nesse país do futebol. Mesmo eles, em seus devaneios mais incríveis, jamais imaginaram que veriam o dia em que um brasileiro reinaria absoluto nesse universo povoado por raquetes e fortunas. Impensável. Um esportista capaz de consolidar a liderança destruindo mitos. Assim foi Gustavo Kuerten.
Parece ter aprendido muito bem a lição que um dia o poeta Fernando Pessoa eternizou:
“Qualquer que seja teu trabalho, põe individualidade nele, esforça-te por lhe pores qualquer cousa de único, de diferente, de teu. Há aventuras até no fazer embrulhos. Há campo para a criação até na redação de faturas”. Ah! As esquerdas de Guga. Talvez não tenha sido por acaso que o triunfo na Marters Cup se deu em Lisboa.
Veja, jornalistas são sempre assombrados pela validade das notícias, e esse fantasma me rondou quando iniciei essas linhas. Mas nunca é tarde pra falar sobre alguém que tem lugar garantido na história.

Para ser lembrado

Esta semana também guardou o final da mais recente passagem do técnico Emerson Leão pela Vila Belmiro. E há um traço que une o treinador santista e o nosso tenista, agora aposentado: a personalidade forte. Quem acha que Guga nunca teve dificuldades para se relacionar com a imprensa, por exemplo, se engana. Não se trata de algo simples.
Os críticos podem ter mil motivos para comemorar a saída de Leão. Só não podem engrossar o coro daqueles que para alimentar uma boa polêmica abrem mão até da razão.
Afinal, Leão não só livrou o time santista de uma campanha vexatória no Campeonato Paulista, como esteve perto de colocá-lo na semifinal da Libertadores.
A falta de resultados do Santos atual está longe de ser um “problema técnico”.

* artigo escrito para o jornal "A Tribuna" 26/05/2008

quinta-feira, 29 de maio de 2008

O país do futebol não tem olhos para as mulheres















Wilson Dias/Agência Brasil





A frase acima, transformada em título do artigo que você começa a ler agora, estava na abertura da matéria que o programa Cartão Verde, da TV Cultura, levou ao ar na última quarta-feira. O mote era uma audiência pública a ser realizada no dia seguinte, em Brasília, para debater o futuro do futebol feminino no país.

Há tempos queríamos "levantar essa bola". Além do mais, não levantá-la significaria, em breve, estar inserido no time daqueles que irão lembrar do assunto apenas no momento em que elas voltarem a brilhar nos gramados olímpicos.

O fato é que a audiência pública acabou remarcada para a próxima terça-feira, dia 03 de junho. Na verdade, uma prorrogação forçada para evitar o vexame de ter que realizá-la sem a participação de pessoas que pudessem dar alguma importância à iniciativa. A CBF, por exemplo, não havia confirmado nem mesmo a presença de um representante por lá.

Juliana Cabral, atualmente no Corinthians, e que voltou a defender a seleção brasileira, esteve no estúdio com a gente. Suas palavras ajudaram a evidenciar a realidade muito distante da merecida que nossas atletas ainda enfrentam.

Mas a parte boa dessa história foi perceber o interesse que o assunto despertou. Fizemos uma enquete, perguntando se nas casas que acompanhavam o programa havia mulher, ou mulheres, que gostavam de futebol. 632 pessoas participaram, e apenas uma disse não.

O descaso com o futebol feminino está refletido no universo dos programas esportivos também. Penso, penso, e não consigo encontrar um produto televisivo que tenha sido pensado com a intenção de cativar essa parte feminina da audiência.

No entanto, olho ao meu redor, e vejo garotas jogando bola, ousadas, dando chapéu nas adversárias.

Entre os e.mails recebidos pelo programa, um nos chamou a atenção. Foi enviado pela Silvana. Começava assim: " Vocês não têm noção de como gosto de futebol...". Em seguida ela contava ter organizado, em 1970, um time feminino no colégio que estudava. A aventura durou dois jogos e foi proibida pela direção.

Anos mais tarde perdeu um namorado. Certo domingo mentiu pra ele, disse que iria visitar uma tia. Foi participar de um jogo comemorativo entre duas agências de propaganda, mas uma foto dela acabou estampada no jornal "Estado de Minas". A verdade veio à tona. Ainda assim, Silvana teve direito a um final feliz. Reatou o namoro, e está casada com o tal há trinta e três anos.

Detalhe, que ela fez questão de ressaltar: Ele não liga pra futebol, mas respeita a paixão dela.

Pouca gente deve ter percebido, por exemplo, que dias atrás, quando uma pesquisa feita pela revista inglesa "World Soccer" revelou as cem personalidades mais influentes do futebol, Marta (85), ela mesmo, apareceu na frente do Pelé (86) e do Maradona (88). Pois, é!

Pouca gente deve ter percebido também, até hoje, foram elas que estiveram mais perto do ouro olímpico que o nosso futebol nunca teve. Isso mesmo!

Em Atenas, o sonho das nossas meninas durou até os seis minutos do segundo tempo da prorrogação. O dos homens, na Olimpíada de Atlanta, em 96, acabou com um "gol de ouro", marcado por Kanu, aos três minutos do primeiro tempo da prorrogação.

Está mais do que na hora do país do futebol enxergar as mulheres com outros olhos.

Marina e Pelé

Esta semana o presidente aproveitou o "ambiente"
e comparou Marina Silva e Carlos Minc à Pelé e Amarildo na Copa de 62.

Só queria dizer que também vejo semelhanças entre Marina e Pelé.
Mas com o Pelé de 66, caçado por adversários mal intencionados.

sábado, 17 de maio de 2008

Um olhar sobre a história

Os dias têm me insinuado que ver o tempo passar e não se render ao saudosismo é um desafio dos grandes, muito maior do que esse que o Corinthians acaba de encontrar ao iniciar sua saga pela série B. O futebol é uma boa prova disso, mas não é a única. Tá cheio de gente por aí, debruçada sobre as referências do passado como se ele ainda fosse possível. E o pior, é que essa insistência em comparar épocas distintas só ajuda a deixar ainda mais evidente a pobreza vista nos gramados atuais.

Eu sei, os saudosistas já devem estar de veias estufadas, bradando algo como: "Quem esse moleque pensa que é? Diz isso porque não viu Pelé jogar!". Tá certo, não vi mesmo, mas que culpa tenho por não ter nascido antes?

Saibam que isso não me alegra nem um pouco. Ao tocar no assunto, quase não me perdôo, por jamais ter perguntado ao meu pai, se um dia, ele me levou a um estádio em que se apresentava o Rei. Ainda que minha memória não tenha gravado um único flash do acontecido, a confirmação me confortaria, não tenho a mínima dúvida.

Saudosistas, fiquem calmos, ninguém será capaz de apagar o virtuosismo e a elegância de um Nilton Santos, de um Didi ou de um Zizinho. Ninguém será capaz de ameaçar aqueles que através da bola ganharam outra dimensão.

E olha, dizer que nunca pude ver Pelé jogar, não é uma verdade absoluta. Lembro muito bem do dia em que o CT do Santos foi inaugurado. As traves virgens aguardavam, claro, o Rei. Ainda posso ver a cena. Pelé chegou, segurou a bola. Mirou a luz do sol. Indicou o melhor lugar para o batalhão de fotógrafos e cinegrafistas. E, então, soltou a bola no chão e, narrando seus próprios movimentos, a chutou de encontro à rede. Deu até Jornal Nacional, lógico. E eu nunca mais esqueci aqueles segundos. Acho até que não seria muito diferente se o craque em questão fosse um Pagão ou um Mané Garrincha.

Fazer o quê? Nessa vida não se pode tudo.

Mas, esta semana, ao ler o artigo escrito por José Miguel Wisnik para a revista PIAUÍ, intitulado "São Vicente e Pelé", vivi o inverso desse sentimento de limitação temporal. Nas palavras do ensaísta e professor de Literatura, embarquei num passeio delirante pelo futebol da Baixada Santista da década de cinqüenta e sessenta. E nelas encontrei o Continental, o Beija-Flor, o Itararé. Times que eu vi jogar, como o Paulistano, onde o clima era sempre de rivalidade pura. Esses esquadrões cravaram nas minhas lembranças lances inesquecíveis, e gols que alegraram muitos domingos.

Então, em silêncio comigo, inundado por uma saudade imensa, pensei. Talvez não os tenha visto no auge, mas vi, ô se vi.

quinta-feira, 8 de maio de 2008

Do ofício

Acabo de ser cobrado pelo fato de não ter colocado neste blog palavra alguma sobre as mudanças feitas no Cartão Verde. Não vou colocar a culpa na correria das últimas semanas. Nada disso. Vou confessar a dificuldade de traduzir um momento profissional tão importante e desafiador.

Mas vamos lá!


"O que você faria se pudesse montar um programa para falar de futebol?
Apostaria nas polêmicas? Abriria espaço para “merchans”?
Contrataria nomes consagrados? Sonharia com repórteres e "links" espalhados pelo globo?

E se esse tal programa já tivesse quinze anos de idade e tivesse visto passar por sua bancada alguns dos mais importantes jornalistas esportivos do país?

Como seria possível alimentar essa quase pretensão de melhorá-lo?

A decisão foi a de apostar em pessoas que tivessem um jeito interessante de interpretar essa arte magnética e monumental de jogar bola.

Foi dar voz a quem, geralmente, entra nessa história apenas na condição de telespectador.

A torcida está na arquibancada em uma parte ínfima de tempo, no mais, anda aí, dispersa pelas ruas, estamos cientes disso.

Assim, o Cartão Verde segue, com novos integrantes, na defesa das melhores bandeiras."


Cartão Verde, agora toda quarta, às onze e quarenta da noite.
No ocaso das rodadas de meio de semana.
Com Xico Sá, Vitor Birner e Sócrates.

Veja... faça críticas... dê idéias !

sexta-feira, 2 de maio de 2008

Esse é o preço

Dias atrás, acordei no meio da noite com o coro de uma torcida. Mesmo sendo vizinho do Parque Antártica, não conseguia entender de onde poderia surgir aquele barulho, uma hora daquelas, num dia daqueles. Era a madrugada de segunda para terça-feira.

Um ginásio? Uma quadra qualquer vivendo um momento festivo? Um bar?
As perguntas foram se sucedendo no quarto escuro.

Será que o silêncio, sempre tão desejado nessa metrópole em que vivo, por uma intrincada soma de fatores teria repentinamente sido possível? E o efeito colateral seria esse, passar a ouvir sons de paragens mais distantes? Inimagináveis?

Não era um coro qualquer, era um senhor coro soando na noite de modo insistente. Cheguei a imaginar que alguém tivesse gravado aquilo, e agora, tomado por uma insônia tivesse resolvido ouvi-lo, alto, para ameaçar o sono dos que tinham tido o dom de adormecer.

A curiosidade venceu. Fui até a janela intrigado. E pelo vão entre dois edifícios que, recentemente, roubaram parte do meu horizonte, desvendei o mistério.

Divisei ao redor da praça, junto às grades do clube, uma pequena multidão, agitada. Em fila. Uma enorme fila, que se não foi suficiente para me roubar o sono, foi tumultuada o bastante para virar pesadelo quase doze horas depois, no início da tarde do dia que estava a caminho, e por um motivo claro: os cerca de quinze mil ingressos para a final entre Palmeiras e Ponte Preta, tão desejados, sumiram das bilheterias em pouco mais de duas horas.

Com três guichês capazes de negociar, cada um, cerca de 100 ingressos por minuto, estaríamos sem dúvida diante de uma invejável prova de eficiência. No entanto, todos sabemos que não foi esse o caso.

A fila, que pouco andou, terminou em pancadaria, com gente ferida, passando mal. Nos dias que se seguiram, os decididos a acompanhar o confronto final do Campeonato Paulista, precisaram bolar táticas mirabolantes, acionar conhecidos influentes e se sujeitar a aceitar um ágio de respeito para, finalmente, ter direito a um ingresso.

Não foi muito diferente no Rio ou em Minas. O futebol brasileiro é um só.

Por isso, esta semana um "ingresso para final estadual" valorizou mais do que as ações da Petrobras, mais do que ouro, do que o euro... mais do que o petróleo.

Os ingressos sumiram, os responsáveis também, e o torcedor segue como sempre: sendo o principal credor desse nosso futebol cada vez mais devedor. Em todos os sentidos.

O fato merece ser relembrado toda vez que um senhor elegante, trajando terno e gravata, voltar a dizer que estamos a caminho de um futebol de primeiro mundo.

Não, não estamos.

quinta-feira, 1 de maio de 2008

Que o gás simplesmente não evapore...

Com certa liberdade poética, o título é a síntese do resultado da última enquete.
O conteúdo era o seguinte:

"Você acha que o Palmeiras deve ser punido pelos incidentes registrados no clássico contra o São Paulo?"

77% dos votantes esperam pela punição
23% acham que não é o caso


Passemos, então, do capítulo do vestiário para o das bilheterias.